PL avança e põe em risco aborto legal de vítimas menores

Câmara analisa proposta que pode derrubar norma do Conanda e dificultar acesso ao aborto legal para crianças vítimas de estupro; especialistas alertam para retrocesso nos direitos infantis

Brasil
PL avança e põe em risco aborto legal de vítimas menores
Foto: Antônio Cruz/ Agência Brasil

Está em curso na Câmara dos Deputados um projeto que promete reascender o debate sobre os direitos sexuais e reprodutivos de crianças e adolescentes vítimas de estupro no Brasil. Trata-se do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nº 3/2025, que visa anular a Resolução nº 258/2024, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).

O relator da proposta, deputado Luiz Gastão (PSD-CE), apresentou parecer favorável à derrubada da norma, alegando que crianças menores de 16 anos não têm autonomia para decidir sobre um aborto, mesmo em casos de violência sexual. O texto já passou pelas comissões da Câmara e pode ser votado diretamente em plenário, caso seja aprovado o pedido de urgência feito por parlamentares como Chris Tonietto (PL-RJ).

O que diz a resolução do Conanda?

A norma em vigor estabelece que nenhuma exigência judicial ou burocrática deve impedir o acesso ao aborto legal por vítimas menores de idade. Também determina que o procedimento deve seguir diretrizes da OMS e evidências científicas, e dispensa a necessidade de boletim de ocorrência ou autorização judicial — especialmente em casos onde o agressor pode ser alguém do próprio núcleo familiar.

O Conanda defende que o aborto legal é um direito das crianças e adolescentes em situações de estupro e que atrasos no atendimento podem agravar ainda mais o trauma e os riscos à saúde.

O que defende o projeto que quer revogar a norma?

Os parlamentares contrários à resolução alegam que ela desrespeita o poder familiar e atribui às vítimas uma decisão que, segundo eles, não cabe a crianças e adolescentes tomarem sozinhas. Também afirmam que a norma fere o direito à vida do feto, e que o aborto não é um direito previsto pela Constituição.

Entre os apoiadores do projeto estão nomes como Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Bia Kicis (PL-DF) e Marco Feliciano (PL-SP). O argumento central do grupo é que a resolução “incentiva o aborto” e retira o controle judicial e familiar de um tema extremamente sensível.

Dados alarmantes: meninas grávidas e mortes evitáveis

Segundo levantamento da Fiocruz Bahia, entre 2015 e 2019, mais de 67 mil casos de estupro contra meninas foram registrados, sendo que a maioria das vítimas tinha entre 10 e 14 anos. Em 2023, 14 mil meninas dessa faixa etária deram à luz no Brasil, enquanto apenas 154 conseguiram acesso ao aborto legal.

A campanha “Criança Não é Mãe” alerta que a derrubada da resolução representaria um enorme retrocesso na proteção à infância. A OMS já reconheceu que complicações na gravidez são a segunda maior causa de morte entre meninas de 15 a 19 anos.

A entidade destaca ainda que meninas grávidas têm risco aumentado de morte, eclâmpsia, infecções e evasão escolar. A taxa de abandono escolar entre adolescentes grávidas chega a 47%, contra 5% das que não engravidam.

Em debate: aborto legal ou retrocesso legislativo?

Com forte mobilização de grupos pró-vida e setores conservadores do Congresso, o tema promete polarizar ainda mais o debate sobre os direitos das crianças vítimas de violência sexual. Especialistas, entidades e organizações internacionais têm reforçado que o Brasil não pode ignorar o sofrimento de meninas forçadas a levar a gestação a termo.

Se aprovado, o PDL 03/2025 pode revogar a única diretriz federal clara sobre o atendimento humanizado e desburocratizado para crianças estupradas — o que representaria, para entidades como a Fiocruz e a OMS, um risco grave à saúde pública e aos direitos fundamentais da infância.

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