Com baianos entre os mortos, mais de 120 corpos são computados em megaoperação
Corpos foram retirados de área de mata e levados para praça pública em ato de desespero e revolta: número de mortos pode ser muito maior que o divulgado pelo governo do Rio

A madrugada desta quarta-feira (29) foi marcada pelo maior e mais assustador cenário de violência já registrado no Complexo da Penha, Zona Norte do Rio de Janeiro. Moradores retiraram das matas da Serra da Misericórdia ao menos 64 corpos que, segundo relatos, seriam vítimas da megaoperação policial na Penha, realizada na terça-feira (28) — já considerada a mais letal da história do estado. Os corpos foram levados e colocados na Praça São Lucas, na Estrada José Rucas, em um ato de desespero e denúncia.
O número total de mortos pode ultrapassar 120 vítimas, superando largamente o balanço oficial divulgado até o momento pelo Governo do Rio. De acordo com o estado, 128 pessoas morreram durante a operação — sendo 60 suspeitos e quatro agentes de segurança. No entanto, segundo o secretário da PM, coronel Marcelo de Menezes Nogueira, os corpos levados pelos moradores não estavam incluídos nas estatísticas oficiais.
A maior parte das vítimas foi encontrada em uma área de mata conhecida como Vacaria, ponto de intensos confrontos entre forças de segurança e grupos armados. O ativista Raull Santiago, que acompanhou a retirada dos corpos, relatou que nunca havia visto algo parecido:
Sem acesso seguro ao Instituto Médico-Legal (IML), moradores decidiram levar os corpos até a rua para que parentes pudessem tentar reconhecer marcas, tatuagens e cicatrizes. Muitos estavam com roupas parcialmente retiradas e com sinais claros de execução: tiros à queima-roupa, rosto desfigurado e lesões que sugerem tortura.
Enquanto parte dos corpos foi levada para a praça, outros chegaram em uma Kombi ao Hospital Estadual Getúlio Vargas durante a madrugada — permanecendo no local por poucos minutos antes de serem removidos. Moradores afirmam que ainda há cadáveres no alto do morro sem resgate.
A Polícia Civil informou que o atendimento para identificação oficial das vítimas será realizado no prédio do Detran, ao lado do IML no Centro do Rio, a partir das 8h desta quarta-feira. O acesso ao Instituto será restrito às autoridades responsáveis pelas perícias e necropsias relacionadas à operação. Casos sem vínculo com os confrontos serão analisados no IML de Niterói.
Enquanto a Secretaria de Segurança Pública ainda não confirma se atualizará os dados oficiais, cresce a revolta entre familiares e moradores das comunidades atingidas, que denunciam ocultação de cadáveres, excesso de força e violações de direitos humanos.
Organizações sociais e representantes do movimento negro alertam para a gravidade do episódio. Em posicionamento recentemente publicado, o Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos afirmou que o cenário reforça “as consequências letais extremas das operações policiais em comunidades marginalizadas do Brasil”.
A megaoperação, que teria como alvo facções criminosas, reacende o debate sobre a política de segurança pública fluminense, historicamente marcada pelo confronto direto e pela ausência de proteção aos civis. Para moradores da Penha, o que deveria ser uma ação estatal de combate ao crime se transformou em um massacre sem precedentes.



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