Boletos pagos (ou um guia para a transição de carreira)

Confira a coluna Falando de Dinheiro

Boletos pagos (ou um guia para a transição de carreira)

O mês de janeiro foi um pouco atípico por aqui. Foi a primeira vez que me vi na situação de estar 100% como planejador financeiro e ter Amanda e Pedro de férias ao mesmo tempo. Na antiga versão de Raphael, aquele jornalista CLT, essa situação não tinha acontecido. A gente sempre conseguia organizar o calendário para que todo mundo pudesse ficar de férias ao mesmo tempo.

Dessa vez, não deu. Mas consegui fazer alguns ajustes. Digamos que foi um mês de meio turno. Um mês de trabalho intercalado com dias de férias – não recomendo, mas funcionou bem.

Em um desses dias, estava com Amanda no restaurante que funciona onde era a casa de Vinicius de Moraes aqui em Itapuã, que tem o nome nada sugestivo de “Casa di Vina” – esse eu recomendo. Depois de comer uma boa pizza, conversávamos com a garçonete sobre o restaurante e como ele estava cheio em uma noite de quinta. Ela comentou que vinha ficando bem movimentado mesmo, principalmente depois que houve a integração total entre o restaurante e o hotel, que ficam praticamente no mesmo espaço – dá até para se hospedar na suíte que era de Vinícius de Moraes.

Lembramos então que já ficamos no hotel. Na hora, tentei puxar na memória quando havia sido. Não sabia exatamente o ano, mas lembrava que restaurante e hotel ainda tinham nomes diferentes e de um fato que marcou. Na noite que estávamos lá, houve uma live promocional de um curso para a prova do CFP. Lembro porque esperei aquele último momento da live quando é anunciada a promoção “que só dura algumas horas”.

Abri o celular, entrei no e-mail e busquei a confirmação do curso: novembro de 2019.

2019!!

Como é que pode ter passado tanto tempo assim? A gente não tinha nem vivido a pandemia ainda. A vida era outra. Completamente outra.

Por aqui eu engatinhava no planejamento financeiro, havia tomado a decisão de fazer a prova do CFP, era CLT, meus dedos eram normais. Como é que pode já ter se passado cinco anos e tanta coisa mudou assim?

Lembrei desse momento quando estava ouvindo um dos últimos episódios do podcast da Nossa, com Amuri e Vivi (que aliás têm enorme contribuição em tantas mudanças nos últimos anos). Em um trecho da conversa, eles falavam sobre a vida do autônomo, e Vivi disse algo mais ou menos assim: “O que paga seus boletos?”

Era uma referência a quem consegue fazer consegue fazer com que o ofício que escolheu, principalmente no caso do planejamento financeiro, seja a fonte de renda para a vida. Não é tão simples.

Quando ouvi isso, lembrei imediatamente da conversa no Casa di Vina. Cinco anos se passaram, e os boletos são pagos pelo planejamento financeiro.

Por isso hoje quero conversar com você que tem a ideia de uma transição de carreira, de mudar de área. Mas vou logo avisando que não tem isso de romantizar quem empreende, quem trabalha por conta. Muitas vezes é por necessidade, não por opção. Está longe de ser o mar de flores que alguns vendedores de ilusão pregam. Mas, com esforço, sacrifício e dedicação, é possível.

Minha ideia não é entrar no debate sobre esse movimento crescente da pejotização. Tem ônus e bônus. É um tema que deve ser analisado com calma. Mas quero falar sobre a parte prática, a organização para esse momento. Acho, usando um termo que vemos muito por aí, que tenho lugar de fala.

Além de preparar a minha própria transição, acompanhei alguns clientes nesse processo que tem como ponto de partida o entendimento do que será feito. Qual a mudança efetiva e a preparação na prática para ela. Não apenas largar tudo para ser dono do seu próprio tempo. Cuidado. Isso vende muito mais curso por aí do que você imagina.

Por isso, o primeiro passo nessa mudança é definir bem o que será feito, não ir na onda de alguém. E, a partir daí, traçar cenários que possam ser factíveis. E é uma espécie de passo a passo a seguir para ter o máximo de tranquilidade possível em um momento onde as incertezas são muitas, principalmente pela saída do salário fixo no fim do mês.

Se ainda não tiver uma ideia de seu custo de vida atual, antes da mudança, faça esse levantamento. Ter esse conhecimento é fundamental para os passos a seguir. Ter o custo de vida é importante para projetar uma reserva no começo da vida autônoma. Como o salário vai deixar de ser garantido ao final do mês, acho que terá mais tranquilidade para focar no trabalho se tiver ou a renda mensal ou uma parte dela durante um período. Gosto de trabalhar com ao menos três meses (algumas pessoas precisam de mais para dormirem tranquilas).

Se o seu salário é de R$ 3 mil e você deseja ter três meses da renda, precisaria de ao menos R$ 9 mil de reserva, concorda? Então a matemática aqui é dividir esse valor pelo tempo que planejar completar a transição. Se pensa em mudar de vez em seis meses, teria que poupar R$ 1,5 mil por mês – nesse caso metade do salário, o que é bem difícil de fazer.

Por isso vem outro ponto importante: definir como será a mudança do emprego. Rescisão? Demissão voluntária? Pedido de demissão? A empresa vai te demitir? São pontos importantes que podem ou não complementar sua receita para o começo do novo caminho. O valor que tiver direito a receber, por exemplo, pode ir direto para a poupança.

Esse é um passo que vai dar muito mais tranquilidade nos primeiros meses de atividade. Você não dependerá exclusivamente do seu faturamento para poder pagar as contas, para ter os boletos pagos, para continuar vivendo como estava acostumado. E, acredite, ter essa poupança fará com que possa focar muito mais em sua atividade, no trabalho, no que deve ser feito.

Por falar nisso, um ponto válido, também, é migrar a atuação aos poucos. Dentro do que for possível em sua rotina e também no regime de trabalho, tente iniciar na nova área devagarzinho. Se puder, ótimo. Inclusive pode utiliza a renda ara compor a reserva. Aliás, presta atenção aqui. Se você começar a nova atividade enquanto ainda estiver no seu trabalho, não caia na tentação de incorporar a renda ao mês. Isso vai fazer você inflar sua receita, o que te dará mais dor de cabeça na transição. Deixa esse faturamento como uma reserva, vai ser muito mais útil assim.

Esse é um plano inicial para que tenha condições mais tranquilas na mudança de área. A transição de carreira não é fácil em diversos aspectos. E uma de minhas funções é tentar fazer com que o lado financeiro não seja um problema na hora de dormir. Se for o seu caso, vamos conversar, entender o cenário e traçar um plano para que, assim como é comigo agora, seus boletos também possam ser pagos por sua nova atividade.

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